Sendo verdadeiros

Sendo Verdadeiros

Na continuação do sermão do monte Jesus incentivou os seus discípulos a praticarem a solidariedade. Ao tratar da solidariedade, da oração e do jejum, o Senhor demonstra mais uma vez que sua rejeição à formalidade da aparência, mas atenta para a sinceridade do coração.

Texto Bíblico (Mateus 6.1-4).

A Sutileza da Hipocrisia

É hipócrita.

Inicialmente, de forma bastante elucidativa, o Senhor adverte contra os falsos profetas que buscam adentrar o seu aprisco vestidos de aparente religiosidade, mas com o coração envolto nos tentáculos da falsidade (v.15). Parecem-se com ovelhas, mas são lobos devoradores. Utilizam-se sutilmente da ética enganosa, para não dizer situacionista, com o propósito de apresentarem-se como verdadeiros santos, mas não passam de arautos da mentira religiosa. Assim, um dos recursos dessa falsa ética cristã é a hipocrisia, que foi a principal característica dos religiosos contemporâneos de Jesus (ver Mt 23.13-23). São capazes de expressar a mais absoluta sinceridade, enquanto pelas costas apunhalam ovelhas indefesas que caem em suas armadilhas. Mas na aparência continuam os mesmos religiosos fervorosos e éticos, os quais, até serem desmascarados, permanecem iludindo a boa dos demais.

É astuta.

Outra característica dessa ética enganosa empregada pelos “lobos devoradores” é a astúcia. A melhor forma de compreendê-la, para não cair nesta cilada, é estar atento aos termos com sentido ambíguo que eles utilizam. Deste modo, dizem propositadamente uma coisa que comporta várias interpretações para que possam adequar-se àquela que melhor servir aos seus vis propósitos. Desde o Éden Satanás emprega a astúcia para enganar o homem, torcendo a própria Palavra de Deus a seu favor (Gn 3.1-5). Até mesmo Jesus, na tentação do deserto, não ficou livre de sofrer as pressões dessa arma maligna usada pelo inimigo na tentativa de fazer-lhe desistir da cruz (ver Mt 4.1-11).

É opressora.

O Senhor também advertiu que os pregoeiros da ética enganosa, isto é, os falsos profetas têm perfil opressor — são lobos devoradores — porque o seu objetivo é destruir o povo de Deus. Esta opressão se caracteriza, entre outras coisas, pela falta de amor, pelo desinteresse em restaurar o ferido, pela indisposição em alimentar o rebanho, pela atitude voluntária de não afastar as ovelhas do perigo e pela negligência de não buscar a que se perdeu (ver Ez 34.1-31). Aos falsos profetas não interessa uma igreja saudável, que possa estar sempre em condições espirituais de curar-se, quando a doença lhe sobrevêm. Por isso só se preocupam em disseminar heresias com aparência de verdade, assim como o joio se assemelha ao trigo. Contra os tais, a palavra do Senhor é radical: “Acautelai-vos” (v.15). Paulo segue também na mesma linha: “Destes afasta-te” (2Tm 3.1-5).

Como se qualifica a Verdadeira Ética

Pela procedência.

A verdadeira ética do cristianismo, comprometida com os absolutos da fé cristã, qualifica-se, em primeiro lugar, pela procedência. Para tanto, o Senhor ilustrou o tema lançando mão da botânica para mostrar que o autêntico arauto da verdade assemelha-se à boa árvore que produz bons frutos (vv.16-18). Em outras palavras, é preciso que se examine a fonte do ensino para que não sejamos enganados pela aparência. O fruto pode parecer palatável, mas torna-se necessário avaliar se a “botânica do Espírito” já qualificou aquela “árvore” como de boa procedência para que seja, então, reconhecida como frutífera.

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Pela qualidade dos resultados.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, o Senhor também evidencia que a verdadeira ética do cristianismo revela-se autêntica pela qualidade dos resultados. Ou seja, não pela aparência dos frutos, mas pelo fato de serem essencialmente bons para nutrir a vida. Assim, por mais que alguns tentem esconder-se atrás da capa da falsa religiosidade, fica também claro que a vida cristã é transparente. Os que agem de forma fraudulenta dentro da casa de Deus não conseguem prolongar suas ações por muito tempo porque logo a má qualidade de seus frutos será exposta pela “botânica do Espírito”. Ananias e Safira se constituem em fortes exemplos de como Deus agiu, nos primórdios do Cristianismo, para dar nitidez ao que significa o compromisso com a verdade do evangelho (At 5.1-10). Eles não foram julgados pelo valor da oferta, mas por tentarem enganar o Espírito, passando para a Igreja uma falsa ideia de desapego aos bens materiais. O princípio implícito no fato determina que a fraude religiosa não perdura entre o povo de Deus.

Consequências da prática da Ética enganosa

Perda dos referenciais absolutos.

A prática da ética enganosa traz consequências desastrosas. A primeira delas é a perda dos referenciais absolutos. Este é o grande dilema dos dias atuais, pois Satanás, subvertendo uma verdade fora de contexto, conduz sutilmente a sociedade à rejeição dos conceitos do que é certo ou errado, afirmando que cada um tem o direito de fazer a sua opção de conduta pessoal à luz da sua própria ética. A mesma tática empregada no Éden. O pior é que muitos líderes religiosos esposam a mesma ideia, pondo o rebanho de Deus sob a vulnerabilidade dos ataques satânicos, pois a fé fica desguarnecida e sujeita a todo vento de doutrina pelo engano de homens astuciosos (Ef 1.14).

Sujeição ao julgamento divino.

Mas o Senhor acrescenta à sua advertência uma sentença: “Toda árvore que não dá bom fruto corta-se e lança-se no fogo” (v.19). Na Bíblia, fogo é, entre outros, símbolo de julgamento (cf. Mt 3.10-12; 1Ts 1.7-11). Isto prova que aqueles que subvertem a fé como profetas da ética enganosa não permanecerão para sempre na congregação dos justos (Sl 1.5). Eles podem até insistir por um pouco de tempo, todavia não subsistirão, tanto pela má qualidade de suas ações, quanto pelo fato de que Deus, acima de tudo, traz o seu julgamento sobre a casa de Deus, sempre que se faz necessário, para extirpar o tumor do engano de entre o povo e, assim, os justos se manifestem (cf. 1Pe 4.12-19).

A Graça da Solidariedade Cristã

A solidariedade cristã não é um fim.

O princípio da solidariedade, que nos leva a estarmos sempre prontos para ajudar o próximo, é uma característica essencial da vida cristã. Tal é a sua importância que o Senhor, no Sermão do Monte, traz o assunto à tona, condenando a atitude farisaica de valorizar o aspecto exterior do ato apenas com o propósito de receber o reconhecimento humano (v.1). A expressão empregada — fazer esmola — não deve ser compreendida como um simples gesto de estender a mão ao pedinte, à beira da calçada, mas como simbolizando o papel da caridade nos relacionamentos humanos.

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A solidariedade cristã não busca o reconhecimento pessoal.

Fica implícito, também, que ajudar o próximo, do ponto de vista cristão, não é para ser trombeteado aos quatro cantos para que nos reconheçam como profundamente interessados pela causa do necessitado (v.2). Ser solidário não pode, também, ter como contrapartida a expectativa de receber alguma coisa em troca de quem é alvo de nossa solidariedade. A parábola do bom samaritano é um bom exemplo, pois este jamais poderia esperar receber qualquer tipo de reconhecimento do ferido à beira do caminho. Foi uma ajuda desinteressada (ver Lc 10.30-37; 6.35).

A solidariedade cristã não visa fins políticos.

Vale também acrescentar outra distorção da solidariedade muito em voga nos dias atuais, conhecida nos meios políticos como clientelismo. É aquela em que o bem é apenas uma moeda de troca que determinados candidatos utilizam em busca da eleição. Eles ajudam o indivíduo esperando receber o voto, sem jamais pensar nos interesses da comunidade, mas em como tirar vantagem do exercício do mandato. Esse tipo de solidariedade tem o mesmo valor da prática dos fariseus: só serve para a autoglorificação, pois em nada contribui para o aperfeiçoamento das instituições.

A solidariedade cristã é um meio de adoração a Deus.

Após condenar a atitude arrogante e egocêntrica dos fariseus, o Senhor trouxe a solidariedade para o seu verdadeiro lugar: um ato de adoração a Deus, que recompensa, publicamente, àqueles que de forma desprendida estendem a mão ao próximo (vv.3,4).

OBS:  Jesus mostra, nesta seção do Sermão do Monte, que atos piedosos podem ser mal-interpretados e adulterados pelos homens. Os exemplos que o Mestre apresenta são o ato de dar esmolas, a oração e o jejum.

A Exaltação das Obras Verdadeiras e Falsas

Ele sabia que esses atos podiam fazer com que o povo admirasse e exaltasse as pessoas que os praticam. Jesus não condena os atos — pois são sinais de piedade — mas sim as consequências dos mesmos quando executados sem os motivos corretos. À primeira vista, nada há de errado em dar ofertas, orar em público ou jejuar. Entretanto, sabendo que os homens julgam o que conseguem ver, e Deus julga as nossas motivações, Jesus advertiu que tais atos não devem ser feitos de forma indigna.

Existe um julgamento e um certo grau de justiça na prática desses atos, quando feitos sem ostentação. Deus e também os homens nos julgam e nos recompensam. No caso dos homens, a glorificação é terrena, temporária e exalta a pessoa que pratica a boa ação. No caso de Deus, a recompensa é celeste, eterna e exalta aquele que pratica a boa ação, porém, de acordo com a intenção do ato praticado. Deus enxerga o íntimo, e não apenas o exterior. A justiça feita por causa de uma exibição — seja ela dar esmolas, orar em público ou jejuar desfigurando o rosto — já teve seu pagamento.

Deus não é obrigado a dar uma segunda retribuição. Basta ao tal “justo” o prêmio dos homens. Quanto aos que se enquadram nas definições de Jesus de como fazer tais obras, é certo que serão vistos por Deus, mesmo que não o sejam pelos homens. Temos garantia, nas palavras de Jesus, de que o próprio Deus se responsabiliza por recompensar as nossas esmolas, orações e jejuns.

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Sua admoestação aqui é contra dar aos pobres pelos motivos errados. A razão que Jesus apresenta para fazer caridade sem ser visto, é que generosidade ostentosa não resulta em recompensa “do vosso Pai, que está nos céus”. Jesus chama ‘hipócritas’ (hypocrites) os que dão pelos motivos errados. Este é linguajar forte para descrever as atividades dos seus inimigos, ainda que anteriormente Ele tivesse advertido contra tais epítetos indiscriminados (Mt 5.22). Atividades auto ilusórias atraem acentuada crítica de Jesus, e Ele acha necessário chamar a atenção das pessoas para o perigo” (ARRINGTON, French L; STRONSTAD, Roger (Eds.) Comentário Bíblico Pentecostal Novo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2003, pp.59,60).

“John Wesley, que era um cuidadoso estudante do texto grego e surpreendentemente ciente da importância da crítica textual,43 traduziu a primeira parte deste versículo [Mt 6.1] como se segue: ‘Atentem para não praticarem a vossa justiça perante os homens, para serem vistos por eles’. Traduções mais recentes apresentam: ‘Tenham cuidado para não fazerem as suas boas obras publicamente para serem notados pelo povo’ (Berkeley); ‘Cuidado ao fazerem as suas boas ações à vista dos homens, para atraírem seus olhares’ (Weymouth); ‘Tenham cuidado para não fazerem uma exibição de sua religião diante dos homens’ (NEB); ‘Tenham o cuidado de não praticarem os seus deveres religiosos em público a fim de serem vistos pelos outros’ (NTLH).

A tradução mais simples é: ‘Não ostentem a sua piedade’. Jesus não disse que não deveríamos deixar que alguém visse as nossas boas obras. Ele já havia admoestado os seus discípulos: ‘Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai, que está nos céus’ (5.16). É com o motivo que Ele está lidando aqui. A frase significativa é: para serdes vistos por eles. Devemos buscar a glória de Deus, não a nossa própria” (CHILDERS, Charles L.; EARLE, Ralph; SANNER, A. Elwood (Eds.) Comentário Bíblico Beacon: Mateus a Lucas. Vol.6. Rio de Janeiro: CPAD, 2006, p.63).

Conclusão

A epístola de Tiago trata com bastante propriedade do tema, reafirmando o ensino de Cristo e vinculando as obras à fé (ver Tg 2.14-26), sem deixar qualquer vestígio de que a solidariedade seja um fim em si mesmo, somente para cumprir um ritual religioso. Um ponto que se destaca no texto desta lição é a afirmação de que não saiba a mão esquerda o que fez a direita (v.3).

A ideia, aqui, é de total despojamento, pois, além de não criarmos a expectativa do reconhecimento alheio, não nos é próprio orgulharmo-nos em nós mesmos, achando-nos mais importantes do que os demais, por qualquer ato de ajuda prestado, que é, sobretudo, resultado da bênção de Deus sobre a nossa vida.

Por fim, o Senhor conclui deixando explícito que, apesar dos lobos que se transvestem de ovelhas, a transparência da vida cristã sempre prevalece, pois tanto os falsos profetas como os verdadeiros crentes são conhecidos pelos frutos que produzem (v.20; Jo 10.27).

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